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O papel do conselho em tempos de líderes messiânicos

O papel do conselho em tempos de líderes messiânicos
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mai. 27 - 5 min de leitura
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Um tema que deve estar sempre no radar dos conselhos diz respeito aos líderes messiânicos. Consciente do impacto de sua voz, ao fazer declarações na mídia ou nas redes sociais, o líder messiânico sabe muito bem que tem o poder de se beneficiar do eco de... sua própria voz.

Tal poder de influência pode ser traduzido em diversos fatores – número de seguidores, reputação científica, geração de riqueza, rankings, etc – e carrega um conflito de interesses intrínseco, que pode ser utilizado para o bem ou para o mal.

Tal eco pode representar, por exemplo, oportunidade de se posicionar, preventivamente, em investimentos, visando benefício próprio, ou também influenciar tendências na direção da promoção de comportamentos ambientalmente conscientes ou projetos de filantropia, como faz a fundação Bill e Melinda Gates.

Arrisco dizer que a influência positiva dos líderes messiânicos para a sociedade depende de características individuais, algumas nativas e outras que podem ser trabalhadas. Integridade, capacidade de escuta e aprendizado, autocontrole de ego e falas e compromisso com responsabilidade tanto social quanto ambiental fazem a total diferença no impacto gerado pelos líderes messiânicos. Quem poderia ser o guardião, o mentor que estimula o equilíbrio e as influências positivas do líder?

Um desafio a mais para o conselho será administrar o ego, ampliar a capacidade de escuta, o dever da responsabilidade social e o cuidado nas manifestações públicas dos líderes. Será que eles estão preparados para escutar ou só escutam o eco de suas vozes? Será que não deveriam ser precocemente educados antes de “bombarem”?

Lideranças egocêntricas em nada combinam com a equação que Jim Collins elenca no livro “Empresas Feitas para Vencer”, no qual identifica o líder nível 5 na combinação de fatores como humildade e força de vontade.

Mas será que a maturidade ideal para equilibrar o ego combina com a ambição e a empolgação necessárias a um empreendedor para materializar seus sonhos, motivar sua equipe e acreditar na transformação de uma ideia em negócio? É difícil para um empreendedor que “vendeu” sua ideia, contagiou e conquistou espaço com sua narrativa, não ficar orgulhoso de sua ideia, hiperconfiante. O sucesso perturba e tira o foco. O conselho pode puxar pela orelha!

O homem que sonha em colonizar Marte já protagonizou eventos no mercado financeiro que não deixaram dúvidas sobre o seu poder de influência. Os tuítes recentes de Elon Musk sobre a Gamestop e declarações sobre impactos ambientais do bitcoin representam exemplos das últimas abordagens do CEO da Tesla que tiveram impacto no valor dos ativos.

O admirável empreendedor transformacional poderia estar emitindo sinais de que o ego e a autoconfiança podem cegar sobre a responsabilidade de suas declarações? A responsabilidade cresce demais quando se voa alto e alcança o céu – onde Musk apenas deseja fazer o pit stop. É possível que para manter-se “inspiracional” seja preciso mesmo o some control.

Um olhar retrospectivo sobre um caso brasileiro de líder inspiracional  talvez nos ajude. Trata-se de uma liderança messiânica que parecia carregar um toque de Midas investidor, semelhante a Musk. Vamos nos lembrar de Eike Batista, o empresário símbolo de sucesso que alcançou o topo da lista dos mais ricos do Brasil, e da forma com que Eike conduzia seus negócios, alimentava sua reputação e seu ego, já inflado com excentricidades acompanhadas pela imprensa.

O empresário representou, por algum tempo, a encarnação de um salvador da pátria, inspirador, moderno e com pautas ambientais e sociais no radar, concretizadas em iniciativas como os projetos de limpeza da Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro (RJ), e doações a hospitais.

A consciência de seu sucesso e de sua capacidade como influencer o fez usar o Twitter para induzir seguidores a comprar ações da OGX. A história nos mostrou que ao se utilizar desse poder para benefício próprio, foi do topo ao solo.  A governança existia no papel, inclusive com um conselho de “notáveis”, mas não era aplicada na prática.

O caso de Eike Batista ilustra que a consciência sobre o próprio poder de influência já indica a magnitude do impacto que manifestações em redes sociais podem gerar. Declarações de líderes messiânicos não são ingênuas, vez que insinuações podem influenciar investimentos e atitudes e ignorar repercussões na sociedade.

Em tempos pós-Covid, quando, provavelmente, surgirá uma nova safra de líderes, um dos desafios do conselho é estar atento ao desenvolvimento da maturidade e responsabilidade dos líderes e, nesse sentido, refletir sobre acordos que mantenham a essência empreendedora ao mesmo tempo em que controlam a possibilidade de manipulação de seus poderes de influência.

Um conselho some control deve evitar que a empresa, stakeholders e moveholders fiquem vulneráveis e submissos nas mãos de líderes messiânicos sem fonte de equilíbrio. Tais líderes, sem perceber, podem deixar de ser inspiradores e se tornarem ditadores que só escutam o próprio eco.


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